segunda-feira, 21 de junho de 2010

O jardim teatral

Perto de casa, a uns oitenta metros de distância, havia um jardim. Ele era grande, e possuía um formato redondo se visto de cima. Ao redor de todo o jardim fora do gramado, havia banquinhos. Mas há quem preferia se sentar aos pés das árvores dentro do gramado. E era ali que eu gostava de ficar. Sentada ao pé da árvore, encostada em seu tronco.

Quem se sentava nos banquinhos, eram apenas os casais de namorados ou as mães e pais das crianças pequenas que traziam ali para que elas se distraíssem. Eu achava isso. Não convinha para uma garota sem namorado, e sem crianças para olhar, ficar sentada num banquinho daqueles. Eu me sentia menos sozinha quando estava junto à árvore. Naquela árvore em que eu ficava eu tinha a vista do jardim todo. Era como se todas as crianças que brincavam fizessem teatro improvisado para que eu assistisse. Até as borboletas que ali voavam pareciam voar sicronizadamente para que eu as admirasse. Os pais, ou os casais de namorados em minha frente, eram para mim, a platéia do outro lado do palco redondo.

Pessoas que se sentem sozinhas sentem-se mais solitárias ainda aos domingos. Talvez por ele ser um dia silencioso demais. O dia em que as crianças vão para a casa de quem quer que seja para se distrair e o dia que os casais resolvem assistir um filme. É o único dia em que o jardim teatral não fica tão animado. Faltam atores, não há muita platéia. As borboletas são as únicas que sempre estão lá. Enquanto o sol brilha, elas não desaparecem. Eu também não.

Mas era segunda-feira de manhã, quando fui ficar sob a árvore para fazer minha tarefa de matemática. Havia várias crianças. Suas mães as levavam lá de manhã, porque o sol matinal faz bem aos ossos. Tentava me concentrar nos cálculos, mas o modo das crianças se divertirem me distraía. Eu não ia ao jardim brincar para me distrair. Mas ia me distrair vendo as crianças brincarem. Mesmo sem querer, eu acabava me distraindo.

Outro dia, uma garotinha que corria, bateu forte a cabeça num banco, e morreu silenciosamente em vista ao desespero da mãe que gritava porque a filha não lhe respondia. Eu assisti a cena. Achei horrível, mas não fiquei traumatizada o suficiente para deixar de ir ao jardim. Aconteceu que naquele mesmo dia, refleti em como a morte é rápida, silenciosa para quem a sofre, traiçoeira, escura e fácil apesar de dolorosa. Então entendi que quando estamos vivos, uma diversão, por mais boba que seja, pode ser fatal. Por isso que eu observava a diversão. Eu me divertia assim, sem correr risco. Mas minha vida era fatal. Tão silenciosa e escura quanto a morte.
Mas voltando ao presente daquela segunda-feira, as crianças brincavam normalmente. Comecei a pensar em como todos tinham suas diferentes formas de se divertir. Alguns cantavam, outros dançavam, outros pulavam, outros sorriam, outros gritavam, outros observavam. Uns brincavam com o cachorro, outros comiam chocolate.

Ah, o chocolate doce. Tentei desenhar o que eu senti ao ver um simples chocolate nas mãos de um menino, mas cada um nasce com um dom. O meu certamente não era desenhar. Eu não sabia ainda qual era meu dom. Minha vida era fatal, e minha única diversão, alegria, era observar aquele jardim, onde as crianças improvisavam cenas para mim. Se bem que isso a tornava melhor.

Então usei o dom que todos possuem. Usei o pensamento.

Bem... Eu pensei que mesmo nos sentindo sozinhos, sempre há alguma presença que nos torna acompanhados. Mesmo que essa presença não esteja exatamente ao nosso lado.
A morte poderia até ser fácil, mas a vida, a partir daquele momento, me pareceu mais fácil ainda. É que na morte, sempre há uma dor. Já a vida, pode se resumir em apenas um chocolate.
Bom, pelo menos o meu verdadeiro começo do que eu chamo de vida se resume nesse alimento açucarado tão singelo e gostoso.

Muitas vezes, precisamos apenas de açúcar para adocicar nossa amargura, ou resolver grandes problemas. Não importa o tipo de açúcar. Pode ser o comestível ou até mesmo o conotativo.
Caso você se sinta sozinho, torne o local onde você está em um cenário. Faça das pessoas, os atores. Faça das ações destes, um teatro improvisado.
Você pode rir ou chorar na peça. Mas o importante é que você reflita. Um simples chocolate mudou minha vida. Uma simples formiga pode mudar a sua. Então, não se preocupe tanto.
Vá adoçar sua vida! Porque se é para viver, então que seja doce.

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Obs: Usei a formiga como exemplo no final porque as formigas estão sempre atrás de alimentos. Principalmente os doces.

Letícia R.

4 comentários:

  1. Obrigada amor *-*
    Que liiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiindo.

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  2. gosto muito de textos que envolvem morte e essas coisas. achei esse texto lindo, mesmo ele sendo triste e solitario. vejo uma pessoa muito solitaria no texto, imaginei tudo. vivi um filme aqui na minha mente. gostei muito!
    ah sim, eu esatva mesmo sem postar tinha um tempo. eu andava meio sem inspiraçoes, eu acho. mas voltei agora. rsrs
    beijooos!

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  3. Muito lindo! Um dos lindos cenários da dramaturgia da vida, nós somos os diretores e damos as ordens, não simples atores :)

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  4. Letícia,
    Participe da 2ª edição do Projeto Entrelinhas http://entrelinhas-projeto.blogspot.com é até o dia 10/07!
    Pegue o selinho do blog e divulgue-nos!

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