domingo, 20 de março de 2011

Sete dias


Lorena abriu os olhos lentamente, sonolenta. Cansada demais, até mesmo para abrir os olhos precisava de esforço, já que as pálpebras destes pesavam. Com o olhar baixo, viu que havia um par de mãos segurando um caderno, o mesmo que sua mãe lhe dera antes de falecer. Era seu diário. Aquelas mãos... Brancas, grandes, e visivelmente macias, ela conhecia. Com um pouco mais de esforço, foi levantando os olhos, até que eles se focaram na face da pessoa que lia seu diário. Era Daniel. E ela sabia que era ele só ao ver suas mãos. Mas quando acordou, também ouviu sua voz. Baixa, mas bem audível. Ele lia:
“10 de Outubro - A gente acaba aprendendo que devemos nos preocupar com nós mesmos, em vez de desejar que os outros o façam para nós. Mas às vezes despencam pessoas em nossas vidas que começam a se preocupar com a gente. E não podemos evitar que essas pessoas se preocupem totalmente, podemos apenas dar bons motivos para que elas não se preocupem tanto. Todas as páginas anteriores foram escritas com letras que até choram, por perceberem minha tristeza. Mas quero que elas sorriam agora. Porque uma pessoa chegou, e como se minha vida fosse uma cama elástica e aos meus pés estivessem meus problemas, essa pessoa caiu, e ao tombar na elasticidade da cama, jogou todos os meus problemas para o ar. E eles caíram fora da cama elástica na hora de descer. Não, essa pessoa não curou meu câncer. Mas curou minhas angústias, minha solidão, e até mesmo meu medo de morrer.”
Lorena fechou os olhos novamente, e repuxou os lábios, num sorriso que manifestava seu contentamento por ele ler aquilo. Ele ainda não havia percebido que ela estava acordada. Prosseguiu:
“Curou tudo que eu precisava para então, ficar firme. Conheci esse alguém no ponto de táxi, quando estava esperando que um carro chegasse, para que eu fosse ao médico. E então ele disse: ‘ Quase nunca tem táxi nesse ponto não é? ’”– Então a voz dela se misturou com a dele – “E eu concordei.” Lorena soltou um riso fraco. Daniel tirou os olhos do diário, e os direcionou a ela, que abriu os olhos novamente, ao perceber que ele parara de ler. Ela sorria.
- Lô! – Exclamou docilmente, colocando a mão no rosto dela.
- Dan! – Fez uma tentativa frustrada de abrir um sorriso mostrando os dentes. – Eu estava ouvindo você ler. Continue. - Me desculpe por estar lendo seu diário. Eu estava...
- Tudo bem. - Ela o interrompeu. – Continua, quero que você leia. – Pegou a mão dele que estava em seu rosto, e segurou-a.
Ele a olhava, tão pálida, com a voz tão fraca, mas ainda sim tão doce... Jamais conseguira negar algo a ela. Então continuou:
“O conheci faz cinco dias hoje. Mas é como se conhecesse há anos. Como se já tivéssemos sido amigos em alguma vida passada. Não é comum, mas acontece às vezes de pessoas se amarem num dia só de conversa. Será que ele sentiu isso também?”
Então ela voltou a ler junto com ele novamente:
“Com todo perdão pela rapidez, eu o amo. Não estou banalizando amar. O que sinto é forte. Não é sempre que nos sentimos vazios de problemas e completos de sentimentos bons com algum desconhecido. Faz pouco tempo. Mas certas pessoas possuem uma habilidade incrível em se tornar parte da gente em questão de minutos. Não porque querem. Mas porque nos cativam.
Ah Deus, que palavra devo usar para te agradecer por deixar que esse anjo chamado Daniel despencasse na minha vida?”
Quando leu a última palavra do último texto que Lorena havia escrito antes de ser internada, olhou do diário, para ela. A claridade que vinha da janela do quarto do hospital cintilou na lágrima que lhe escorria pela face. Ele abaixou a cabeça para o diário novamente, observando aquelas letras, que sorriam para ele. O ambiente era um quarto verde claro, cheio de aparelhagens. Lorena estava fraca, doente, deitada naquela maca onde Daniel sentara-se para ficar ao lado dela. Ele estava emocionado, preocupado. E ela apenas o olhava, serena.
- Dan... Eu não quero nem imaginar como eu estaria agora se você não estivesse aqui. Sempre tive medo de morrer. – Começou falar num fio de voz.
- Lô, estou aqui. E você vai ficar bem. – Ele tentava consolá-la, triste. Mas ela não precisava de consolo. Ela sabia que não tinha muito tempo.
- Eu estou bem. Porque você está comigo. Acho que minha hora está cada segundo mais próxima. Mas não estou com medo de partir. É tão motivador morrer sabendo que conheci alguém como você antes de ir. E também, sua presença me acalma. Não sinto medo quando estou com você. Não sinto nada. Só sinto... Felicidade, pra resumir todas as boas sensações que tenho ao seu lado.
- Você é que é meu anjo, Lorena. E eu sei como são suas sensações. As minhas são as mesmas. E é tão bom senti-las. – Dizia a ela, olhando-a com os olhos cheios de lágrimas prestes a cair. Havia sinceridade demais em seu olhar. – Eu te amo! Não me deixa! – Soltou finalmente as lágrimas para fora dos olhos, inclinando o corpo para abraçar Lorena.
Assim que se se encostou a ela, sentiu que ela respirou fundo. Passou a mão direita pelo cabelo dela, bagunçando o penteado de trança de lado que a enfermeira lhe havia feito. E foi aí que percebeu que a cabeça dela pendera um pouco para trás. Foi segurar seu rosto entre as mãos, e os olhos dela não estavam mais abertos. Não havia mais pulsação. Desesperado, encostou-a no encosto da maca, e deitou a cabeça sobre o peito dela. Chorava demais. Sussurrou para si mesmo:
“Se te fiz tanto bem, então somos dois anjos. Mas quando um anjo cai, um tem que subir. O céu também precisa deles. Ah, meu anjo! Não deixe de vir me fazer companhia, mesmo que eu não sinta sua presença! Até os anjos precisam de outro anjo para protegê-los.”
“Você despencou na minha vida, e me protegeu de mim mesma. Mas não se preocupe. Estarei sempre aqui com você, ainda que você não me veja. Estarei com você, até que nos encontremos novamente.”- A voz dela soou sem que ele ouvisse.


Daniel parara de chorar no mesmo instante em que ela terminara sua fala. Estava mais calmo. Porque seu anjo estava ao seu lado. Ele não a ouvia, nem a via. Mas a sentia por perto, e sabia que ela estava ali. Era inconfundível a sensação que ele tinha quando estava com ela. Sempre fora. Porque anjos sempre acalmam os desesperados.

Chegaram os médicos e enfermeiros. O choque elétrico não fez seu coração voltar a bater. Daniel observava de longe o corpo, triste, mas de uma tristeza menos eloquente. Dia 12 de outubro, um anjo voltara para seu lugar. O anjo que Daniel ajudara a ser feliz em apenas sete dias. Aquele anjo triste, doente e medroso, que partira feliz e sem medo. Porque afinal, havia conseguido um par de asas para voltar para o lugar de onde viera.

7 comentários:

  1. lindo...
    sinceramente me emocionou...
    =***
    se cuida...

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  2. AH *-*

    que liindo MARGE ..
    perfeito *-*


    bea pikatchu aq (:

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  3. Ahh.. que emocionante esse texto.
    Inspirado em "Um amor pra recordar" né?
    Lindo!

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  4. Emocionante :D
    Gostei muito, aliás que bom que a Lorena encontrou o seu lugar! E, Leti, que bom que você gostou do meu texto. Adorei sua visita!

    Beijos e boa noite!

    Com amor,
    |Cynthia|

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  5. Os adultos vivem dizendo que a adolescência é um dos periodos mais marcantes da vida, Mais o que o adolescente pensa disso?

    Acessa o meu blog?

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    Se gostar do meu blog, segue lá, ficarei muito feliz.
    Desde já obrigada, tenha uma ótima semana.
    Atenciosamente Tainã Almeida.

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  6. Um texto lindo, porem cansativo. Lindo mesmo!

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  7. Olá Letícia !
    Gostei do seu blog. Visite os meus:
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